Em queda livre desde 2014, as finanças de São Gonçalo estão prestes a ganhar um reforço com a contratação de Auditores Fiscais, profissionais responsáveis pela a arrecadação. Atualmente, a cidade tem o pior índice de Auditores Fiscais por 100.000 habitantes do Brasil. Entretanto, apesar de parecer uma boa notícia, o número de contratações está causando questionamentos de especialistas que contestam o prosseguimento pelo prefeito José Luiz Nanci da política de contratação desses profissionais planejada pelo ex-prefeito Neilton Mulim em 2016, quando foi realizada uma seleção para 5 vagas. Na época, São Gonçalo não se encontrava em estado de calamidade financeira, menos aposentadorias estavam previstas e a equipe contava com mais profissionais.

Apesar da situação se agravar, a ideia do governo atual e da chefe de gabinete municipal, Eliane Nanci, é de manter a contratação de apenas 5 Auditores Fiscais, que será feita em janeiro de 2018, de acordo com fontes internas na Prefeitura. Caso esses profissionais produzam os resultados desejados, haveria a hipótese de que mais 5 Auditores sejam contratados no final do ano de 2018. Para Ricardo Ferreira, um dos mais renomados professores de Direito Tributário do país, autor de diversos livros sobre o tema e Auditor Fiscal do município do Rio de Janeiro, essa política de recursos humanos é errada, insuficiente e não trará os resultados desejados:

"Primeiro, o gestor público não pode condicionar uma política de contratações ao desempenho de alguns poucos profissionais. Caso a reduzida equipe não produza como o esperado e o governo deixe de contratar, quem perderá será o Município, que continuará com uma fiscalização insuficiente. Além disso, esses poucos servidores contratados não conseguirão contribuir para um choque de gestão, nem para uma troca produtiva de experiências, fundamentais para reoxigenar o departamento, melhorar procedimentos e prevenir/coibir práticas ilícitas", afirma o professor.

Para o professor, a contratação de Auditores Fiscais precisa atender critérios específicos:

"O quantitativo ideal de Auditores Fiscais varia de acordo com o porte do município, número de empresas ativas e tamanho atual da equipe. No caso de São Gonçalo, estamos falando do 16ª maior município do Brasil, de milhares de contribuintes do ISS e do cadastros de IPTU. A cidade já contou com 50 profissionais. Se a equipe atual conta com apenas 23 servidores, sendo 16 em efetivo exercício, dificilmente apenas 5 novos servidores farão a diferença. A arrecadação pode até melhorar, mas não de forma a maximizar todo o seu potencial. Mesmo que você aloque todos no ISS, ainda é pouca mão de obra nova para fiscalizar o alto volume de contribuintes. Ademais, você não pode deixar de dar atenção ao IPTU, ITBI, taxas. Enfim, apenas 5 servidores novos poderiam ser adequados para um município com 70 mil habitantes com uma equipe reduzida, mas esse não é o caso de São Gonçalo", disse o professor.

AUDITORES FISCAIS SÃO INVESTIMENTO E GERAM RECEITAS

Fontes internas afirmam também que o gabinete do Prefeito alega falta de verbas para mais contratações. De acordo com Fabrício Massena Petruccelli, Auditor Fiscal da Receita Estadual do Rio de Janeiro, não devem ser alegadas dificuldades orçamentárias para a contratação desses profissionais, pois o trabalho de cada Auditor paga com folga seu próprio custo e gera muito mais recursos, ajudando o Município a sair da crise:

"Caso São Gonçalo queira ter recursos para suas políticas públicas, julgo fundamental a contratação de novos Auditores. Com a equipe reduzida que o Município atualmente conta, a tendência é que as empresas encontrem meios de não pagar tributos, até mesmo pelo sentimento de não estarem sendo fiscalizadas. É importante que se mantenha uma rotina em que as empresas sejam fiscalizadas periodicamente. Costumo dizer que investir em auditor não é gasto, é investimento, pois reflete diretamente na Receita. No caso de São Gonçalo a cidade já esperou 12 anos para trazerem novos profissionais. O último concurso foi feito há 1 ano e meio. Não parece razoável que a administração nesse período não tenha se planejado para um investimento verdadeiro nesses profissionais e reposição dos que saíram", conta Fabrício Massena Petruccelli.

AJUDA DE PROFISSIONAIS EXPERIENTES ESTÁ SENDO IGNORADA

Para Carolina Sampaio, especialista em RH e seleção de talentos e que tem como clientes empresas multinacionais, a Prefeitura pode estar ignorando colaboradores experientes e que desejam trabalhar pela cidade:

"Veja bem, na 7ª colocação do último concurso você tem uma Auditora do Estado do Maranhão, na 10ª colocação um gonçalense que é Auditor de Araruama e na 14ª um Auditor de Cuiabá, por exemplo. Todos com idade média de 30 anos e que querem trabalhar pela cidade porque assim estarão perto de suas famílias. Eles não precisam nem passar por um treinamento extensivo, já possuem experiência e chegarão arrecadando desde o 1º dia. A administração de São Gonçalo não está atenta a qualidade desses profissionais que inclusive poderão ajudar os menos experientes durante o treinamento."

EM NITERÓI A ENTRADA DE AUDITORES GEROU AUMENTO NA ARRECADAÇÃO. CÂMARA DE VEREADORES DE SÃO GONÇALO APOIA A CONTRATAÇÃO DE MAIS AUDITORES

Entre os maiores municípios do Estado do Rio Janeiro, São Gonçalo é um dos poucos que não contratou esses profissionais durante a crise financeira. Enquanto municípios vizinhos se modernizaram, São Gonçalo parou no tempo. Niterói, por exemplo, investiu em tecnologia, pessoal e, é claro, Auditores Fiscais. Entre 2016 e 2017, a cidade contratou 30 novos profissionais que aumentaram a arrecadação. Hoje a equipe conta com 60 profissionais e esse investimento reflete no bom desempenho das finanças da cidade. Segundo Thiago Castro, Auditor Fiscal Niterói e Chefe de Programação Fiscal do Município, não se pode relegar a um segundo plano a importância da Carreira no cenário de crise fiscal:

"A entrada de 23 novos Fiscais em Niterói rendeu um aumento de 11% na Arrecadação, sem que fosse preciso aumentar tributos", disse.

Ao contratar apenas 5 Auditores Fiscais, São Gonçalo continuará com menos profissionais que municípios menores como Araruama (29), Caxias (44), Niterói (60), Volta Redonda (28), Nova Iguaçu (34), Campos (98), por exemplo. Em 2017, diversos vereadores manifestaram-se na tribuna em favor da contratação de mais profissionais. O vereador mais votado da cidade e presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Salvador Soares, lidera as discussões na tribuna:

"Nossa cidade precisa de Auditor Fiscal para que a nossa arrecadação aumente", afirmou o vereador em recente discurso.

A contratação de Auditores também recebe o apoio dos vereadores Bruno Porto (PPS), Jalmir Júnior (PRTB), Armando Marins (PSDB), Alexandre Gomes (PSB), Professor Paulo (PC do B), Sandro Almeida (PSDB), Jorge Mariola (PHS), Jose Carlos Vicente (PSL), entre outros. Em novembro de 2017, o vereador Armando Marins propôs uma emenda no orçamento para que seja garantida a contração de, no mínimo, 10 Auditores em 2018. Dessa forma, a cidade garantirá a reposição das 10 aposentadorias que ocorrerão nos próximos anos. A emenda está pendente de aprovação na Câmara e de sanção do Prefeito José Luiz Nanci.

MINISTÉRIO PÚBLICO INVESTIGA O CASO

A falta de Auditores Fiscais em São Gonçalo também chamou a atenção do Ministério Público. O Grupo de Atuação Especializada no Combate à Sonegação Fiscal e aos Ilícitos contra a Ordem Tributária (GAESF-MP) abriu um inquérito civil para analisar a situação da arrecadação da cidade. Foram feitas reuniões com o Secretário de Fazenda Eduardo Combat e a primeira-dama e chefe de gabinete, Senhora Eliane Nanci. No momento, os promotores estão trabalhando junto com o TCE-RJ e analisando todos os dados para identificar o quantitativo ideal desses profissionais. A expectativa é de que nas próximas semanas as autoridades do Município seja acionadas para que essa situação seja resolvida.

Enquanto a situação não é resolvida, São Gonçalo continua amargando resultados ruins de arrecadação. No 3º trimestre de 2017, o ISS, principal imposto da cidade, obteve uma queda de – 4,16% quando comparado com o mesmo período de 2016. Outras cidades como Niterói (+ 4,99%), Araruama (+ 1,44%) e Volta Redonda (+ 26,77%) tiveram resultados positivos no mesmo período. Qual a diferença dessas cidades para São Gonçalo? Todas investiram na Fazenda Pública nos últimos anos trazendo Auditores Fiscais e infraestrutura.